Especial Transição Energética: conheça a experiência da Gerdau

O Brasil tem um grande potencial quando o assunto é transição energética. Seja pela abundância de fontes renováveis, que resulta em uma matriz elétrica majoritariamente limpa, seja pela capacidade de expandir os investimentos em gás natural. A indústria eletrointensiva já projeta esse tema há anos e vê, na possibilidade de redução de consumo de energia, um importante aspecto para a sustentabilidade do seu negócio. Nesta edição do Especial Transição Energética você confere um pouco da experiência da Gerdau, retratada em entrevista com Marcos Prudente, Gerente de Energia na Gerdau e membro do Conselho Diretor da ABRACE, e Cenira Nunes, Gerente Geral de Meio Ambiente na Gerdau.

O que a Gerdau entende por transição energética, considerando seus projetos?

Marcos Prudente: Essencialmente, a transição energética é quando você consegue substituir os elementos de energia que resultam na emissão de gases de efeito estufa por elementos que não vão gerar tais gases. Mas eu acredito que não se restringe somente a isso. Junto com essa pauta vem outra muito importante que é a da eficiência energética. A siderurgia é uma das indústrias mais antigas e a sua produção há muito tempo se pautou em processos de alta emissão de CO2e. Então, a transição energética na siderurgia está atrelada a dois aspectos: a escolha dos insumos de energia para a transformação, e o próprio processo químico da siderurgia que deve transitar para um processo com menor impacto de emissão de gases de efeito estufa.

Quais ações já foram iniciadas?

Marcos Prudente: Essas ações estão presentes na rotina da Gerdau. Um exemplo é a utilização da tecnologia de reciclagem. Do ponto de vista energético, esse processo é muito mais eficiente, porque você está reaproveitando o aço que já está produzido. A Gerdau é uma das maiores recicladoras das Américas e utilizamos esse processo em larga escala nas regiões onde atuamos. Além disso, parte da nossa produção é feita utilizando carvão vegetal, que é um insumo renovável. Temos uma das menores emissões da siderurgia no mundo, mas ainda é possível fazer mais. Por exemplo, voltando nossos olhares para a energia elétrica renovável, combustíveis de menor emissão, eficiência e melhoria tecnológica.

Cenira Nunes: Esses são os nossos pilares para a descarbonização: sucata e uso de carvão vegetal. Fundamental pontuar que a produção de aço a carvão vegetal é algo muito próprio do Brasil. É uma rota extremamente importante e que valoriza as características brasileiras de clima e de vocação para o agronegócio, viabilizando uma substituição parcial, mas importante, do carvão mineral para o carvão vegetal.

Qual o planejamento para o futuro em relação às ações que promovem e visam contribuir com a transição energética?

Marcos Prudente: Acabamos de anunciar a primeira meta de emissão para o ano de 2031 e um segundo degrau para 2050 com a ambição de nos tornarmos carbono neutro. Falando de energia elétrica especificamente, nós já utilizamos a geração de fonte renovável (hidrelétrica). Além disso, reaproveitamos gases do processo siderúrgico quase na sua totalidade. Recentemente anunciamos também a construção de parques solares no Brasil e nos Estados Unidos e, paralelo a isso, temos um experimento com caminhões movidos a gás natural em Minas Gerais. A engenharia de processos também tem um papel relevante, olhando os upgrades tecnológicos com relação ao menor consumo.

Você acredita que o setor produtivo brasileiro já prioriza esse viés da sustentabilidade?

Marcos Prudente: Algo muito próprio da indústria eletrointensiva é que gastar muita energia não é interessante economicamente. Então, ter um processo eficiente faz parte da sustentabilidade econômica do negócio. Os conceitos de reaproveitamento ou de maior eficiência tem um impacto ambiental e econômico relevante. Hoje se fala muito do ESG, mas a indústria eletrointensiva sempre perseguiu a eficientização. É claro que há barreiras. Às vezes, para migrar para um processo mais novo e moderno, é preciso investir bastante. Mas acredito que, para as indústrias do Brasil, sempre foi um ponto de atenção. Isso porque, um dos principais indicadores de uma planta eletrointensiva é o seu consumo de energia antes de tudo.

Com relação ao ambiente internacional, você entende que o Brasil está em um bom patamar de investimentos em transição energética?

Cenira Nunes: O que acontece é que em continentes como a Europa, ou mesmo em países como o Canadá já existe o mercado regulado de carbono, ou seja, a transição energética ganha um impulsionador no sentido de energia de menor impacto de emissões. Temos visto nas siderúrgicas como um todo uma pressão regulatória, principalmente daqueles que estão na Europa, e uma pressão dos clientes e dos investidores, buscando adquirir ou investir em empresas com diferenciais de emissão de gases de efeito estufa. E aí, a siderurgia acaba se movimentando no sentido de buscar tecnologias disruptivas, como é o caso do hidrogênio. No setor, o foco até 2030 vai ser eficiência energética e, a partir de 2030, será o investimento em tecnologias mais disruptivas, que devem ficar mais viáveis do ponto de vista tecnológico e de escalabilidade, dependendo fortemente de políticas públicas para esta transição.

Acredita que o Brasil utiliza todo o potencial que tem para promover a transição energética?

Cenira Nunes: Eu acho que é importante reforçarmos o uso do carvão vegetal, criando métricas que reconheçam as remoções de carbono e que nos ajudem a divulgar essa rota produtiva internacionalmente. Nós temos esse potencial. Obviamente, nem todo o aço consegue ser feito com carvão vegetal, por questões de limite de processo e de disponibilidade de florestas, mas é algo relevante que temos no País. A longo prazo podemos mencionar o hidrogênio. O “bom hidrogênio” é aquele que vem de energia renovável, o mais limpo de ser produzido. O Brasil tem essas vantagens. Além disso, temos falado muito do gás natural como um gás de transição. A rota tecnológica que utiliza como matéria-prima o minério, pode utilizar gás natural, gerando uma menor emissão. O nosso País é abundante em gás, mas ainda precisamos de um valor mais competitivo que viabilize a sua utilização como uma energia de transição.

Marcos Prudente: O Brasil é um potencial em gás natural, mas a utilização dessa energia ainda é pouco explorada. Hoje nós importamos o carvão mineral que usamos em nossa produção, esse é talvez o único insumo que importamos aqui no Brasil. Quando você usa o gás, você está também fomentando a indústria nacional, que vai produzir com insumos todos do Brasil. Ter um mercado dinâmico com preço competitivo é importante e a siderurgia pode ajudar, inclusive, a criar demanda para esse mercado de gás nesse contexto de transição. Temos um potencial muito grande ainda a ser explorado, talvez um dos principais no setor industrial. 

Voltando ao setor produtivo brasileiro. O investimento realizado pelas indústrias é revertido em diferencial competitivo?

Marcos Prudente: O setor está buscando a constante atualização tecnológica e de processos, e nós conseguimos ser muito competitivos na base de produção industrial e de energia. No entanto, na hora que eu vou consumir esse insumo, ele ainda tem um custo elevado por conta do Custo-Brasil, entre eles as estruturas de mercado de energia que agregam valores adicionais ao consumo. Mas o potencial é enorme, uma vez que poucos países do mundo reúnem as condições que o Brasil possui.

Qual a importância da regulamentação do Mercado de Carbono no Brasil?

Cenira Nunes: Precisamos incluir o Brasil nessa agenda de uma forma mais estruturada. Para que possamos transacionar nossos créditos é importante que as regras estejam bem definidas, de maneira a garantir segurança para o mercado. Sempre falamos da vocação florestal e agro do nosso País. Mas como oficializamos isso dentro de uma estrutura organizada? O Projeto de Lei em tramitação no Congresso traz instrumentos importantes para colocar a agenda de descarbonização dentro da estratégia das organizações e do governo. Quando nos colocarmos em outros mercados do mundo com as nossas regras claras, de forma que seja possível entrarmos nessas discussões internacionais de uma forma mais transparente com essas ferramentas e políticas, poderemos trilhar esse caminho de descarbonização do País, com competitividade acima de tudo.

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