Entrevista com o Conselheiro Rafael Z. Garrio

A indústria atua na vanguarda da transição energética a partir do aprimoramento dos processos produtivos e do investimento em novas tecnologias. Para acompanhar as mudanças do setor, é fundamental o avanço regulatório. Rafael Z. Garrio, Gerente Comercial e Regulatório na Alcoa e membro do Conselho Diretor da Abrace, destaca na entrevista a seguir como o ambiente de poder pode atuar para contribuir na construção das novas regras, proporcionando um ambiente de negócios favorável alinhado a um posicionamento sustentável.

Qual o papel da indústria para a transição energética brasileira?
O termo “transição” por si só já envolve uma sobreposição de paradigmas que, na indústria, se refletem em questões tecnológicas, financeiras, procedimentos, entre outros. Os associados da Abrace, que concentram 40% do consumo de energia elétrica industrial do Brasil e 42% do consumo de gás natural atuam como vanguarda nesta questão buscando sempre melhores práticas e novas tecnologias, pois é um requerimento constante do manter o pioneirismo da indústria nacional, assim como fazer frente ao mercado internacional que estamos inseridos. É papel da indústria também cobrar das lideranças nacionais regulamentações, equilíbrios e demais ações necessárias que permitam o avanço da transição energética, evitando percalços e perdas de oportunidade perante o mercado internacional. Na Alcoa, temos o papel de apresentar a nossa liderança que o Brasil apresenta maturidade para este tema e colocar a localidade como preferência para grandes investimentos neste assunto, possibilitando a implantação de produtos como: (i) o SUSTANA, uma linha de produtos de baixo carbono para a fabricação de Alumina e Alunimio e aumento da reciclagem; ASTREA, que é uma tecnologia proprietária em desenvolvimento que pode purificar a sucata de alumínio pós-consumo, independentemente da combinação da liga; (iii) ELYSIS, que é o desenvolvimento de um anodo inerte (emissão de O2) que elimina totalmente as emissões de CO2 no processo de fundição e; Refinaria do Futuro, onde a Alcoa participa no desenvolvimento de tecnologias (MVR e Calcinador elétrico) visando a redução de água e energia no processo de refino da alumina, reduzindo o uso de combustíveis fósseis em até 70% e aumentando o uso de energia renovável dentro do processo.

Por que a modernização do setor elétrico é tão importante?
Com vasto parque gerador composto por energias renováveis, nossa matriz energética oferece grande suporte para transição energética e redução das emissões, em linha com os programas de Net-Zero divulgados pelas mais diversas empresas. Nosso setor elétrico opera ainda com regras e diretrizes publicadas há décadas, que hoje se mostram obsoletas perante os desafios atuais para integração de fontes e perfis de consumidores, resultando em gargalos para manter seu crescimento sustentável. A necessidade de precificação de energia mais aderente com a realidade atual, separação de lastro e energia, redução de encargos e subsídios, sustentabilidade da transmissão e integração gás e energia necessitam de ser adequados para não perdermos o passo do crescimento da indústria. Hoje, na Alcoa, enxergamos a eletrificação do processo industrial como chave para transição energética, dada a matriz que temos disponível e que nos permite substituir fontes convencionalmente utilizadas com alto teor de emissões.

O que podemos esperar e como o setor de gás natural deve avançar a partir do cumprimento da harmonização regulatória, estabelecida na Lei do Gás, a qual estabelece que os estados devem acompanhar o que foi definido em lei federal?
Uma vez que as fontes de originação de gás natural não são uniformemente distribuídas pelos estados, há necessidade de um ambiente que permita seu transporte, negociação e liquidação de forma completa e clara. Temos um modelo no setor elétrico que permitiu o desenvolvimento das fontes e sua destinação às mais diversas localidades do País, para atendimento da indústria e atuando de forma a dar complementaridade em regiões que sofrem de sazonalização na produção de energia. A barreira atual no setor de gás natural se dá pela falta de alinhamento entre Estados, regras discrepantes, comunicação entre regiões e proatividade para que este insumo seja amplamente distribuído pelo pais. Uma força tarefa entre entre ANP e MME se faz fundamental, amparados pela Lei do Gás, para que o tema avance.

Qual a importância da ABRACE para os consumidores, para a indústria e para o desenvolvimento do setor energético?
A Abrace atua de forma vigilante sobre o setor energético, identificando oportunidades, assuntos que possam trazer distorções regulatórias e mantém contato próximo com as instituições governamentais para levar de forma simples o complexo arcabouço regulatório que nosso setor está inserido. Sua riqueza de informações vem através da excelente capacitação de seus integrantes e também pelo contato direto com os associados, permitindo troca de experiências e crescimento conjunto das empresas a respeito de temas relacionados à energia. Trabalhos marcantes como levar à população geral o impacto de subsídios em produtos adquiridos pelo contribuinte e identificação de políticas públicas ineficientes, inseridas em meio a programas como privatização da Eletrobras, destacam a atuação da associação a favor de nosso setor. A Abrace tem um papel fundamental em ajudar a desenhar (e questionar) políticas públicas com autoridades, por meio de uma atuação estratégica com os poderes executivos e legislativos no âmbito federal e estadual. É fundamental sua liderança em discussões regulatórias e exercício do papel de porta-voz dos consumidores no Congresso, assim como busca por soluções e melhorias para empresas navegarem no sistema atual.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *